domingo, 19 de junho de 2011

A primeira noite

         Estava toda arrumada, passara a tarde toda ajeitando o cabelo, escolhendo a cor certa da lingerie, o batom que usaria,o perfume, o escarpin que combinaria, o que diria antes e depois.
         A ansiedade a acompanhava com o tic-tac do relógio. Tudo isso a fazia suar frio e imaginar o que aconteceria, tanto tempo planejando aquele momento. Velas! Velas são uma boa iluminação! Aquela meia luz para que ele não visse a verdade sobre seu corpo, aquela verdade que o jeans do século XXI com toda a sua tecnologia encobre bem, excitantemente bem.
         A noite começava a cair e a hora em que ele chegaria estava cada vez mais próxima. Cabelo? OK! Lingerie? OK! Maquiagem? OK! Perfume? OK! Frases feitas? OK!
       Tudo certo para o momento em que saberia o que é ser uma mulher de verdade. Uma hora! Apenas uma hora para sua chegada. Nesse momento lembrou-se de todas as histórias que ouvira acerca da primeira vez. Sua prima sempre dizia “Prepara-te para a dor!”, suas amigas “Vai, “dá” de uma vez! Ficarás velha e com tudo caído! Aproveita que és jovem e “dá”!”, sua mãe, tias, avós e a velha guarda protetora da família afirmavam “Sexo? Deve ser na lua de mel! Depois de um lindo casamento com véu e grinalda! Antes? Jamais!”, os jornais e revistas sempre com a mesma enquete “Sexo torna-se banal na sociedade”. Mas e ela? O que pensava sobre isso? Bom ela pensava que não iria doer tanto quanto doeu a primeira vez de sua prima hipocondríaca, não queria “dar” tão rápido quanto suas amigas, mas sentia que ficaria velha e a gravidade como inimiga da mulher faria com que seus peitos caíssem, não queria casar e não ficaria virgem pelo resto de sua vida, e achava que a mídia andava muito sensacionalista.
        Se acalmou, estava preparada, bastante preparada, surpreendentemente preparada.O interfone toca, ela liga a TV e vê seu querido amante pelo sistema de segurança, todo elegante, com vinho, chocolate e rosas. Achou-o lindo, quase que sentiu o seu perfume entrando pela fresta da janela entreaberta, ficou contemplando-o perdidamente, tão perdida que não percebeu o tempo passar, muito menos a impaciência de seu homem ansioso a sua espera. O interfone toca incessante, ele pega o celular, ela ouve o seu tocar, mas permanece contemplando a cena. Ele se escora na parede, espera um longo tempo com um semblante preocupado e parte enquanto ela observa tudo e em silêncio dorme sentindo-se pura e desejada.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

2012

Muitos dizem que o mundo acabará em 2012, tudo balela! Como não acabou naquele início apocalíptico de 2000. Ah que desespero! Diziam algo sobre meteoros, explosões vulcânicas, chuva de pedras...
 Enfim, não terminou ou terminou para quem deixou de respirar naquele ano, um dia o mundo terminará para todos (isso é certo e irremediável!), alguns preferem a coletividade e afirmam: o mundo acabará em 2012.
O mundo morre e nasce a cada dia! No movimento incerto dos automóveis, na pressa dos transeuntes... Cada passo é um passo para o infinito. O além é logo ali e nessa correria incessante perde-se um pouco de mundo, um bocado de paisagem. Por vezes, um olhar atento nesse turbilhão nota uma folhinha verde no asfalto, um ninho de passarinho perdido no improviso da cidade.
Bobagem pensar nessas coisas! O tempo passa, a folha morre, brotam prédios, caem árvores e tudo se repete, girando a rotina e as estações, mudando o horário, criando rugas, acumulando gorduras...
Todos trabalham para ter a desejada estabilidade! Que boas recordações de quando se era instável, de ter conhecido a pessoa que dorme ao seu lado - que já não é a mesma de outros tempos - de ter criado os filhos e ver os mesmos erros repetidos.
Os mesmos erros, perfeitos erros! Quantas oportunidades de mudar e nenhuma tentativa! Mesmo com o passar do tempo não se tem a coragem de alterar o que se quer! Rever um grande amigo, doar afeto a quem necessita, sentir a brisa, ler quadrinhos, rir à toa, ressuscitar um grande amor...Cada escolha resulta em pelo menos um ponto positivo e outro negativo, os otimistas e os pessimistas vivem a discutir esse assunto...
Dessa forma, a única coisa nisso tudo que não é balela é o poder de escolha, pois o mundo nasce e morre a cada dia.

terça-feira, 14 de junho de 2011

A literatura secreta

            Existe uma literatura produzida exclusivamente por mulheres que não é difundida: a literatura de banheiro.
            Este tipo de escrita é tão complexa que chega a ser uma espécie de sociedade secreta de exposição de ideias, sentimentos e ideologias. A forma de publicação é feita em portas, paredes e assentos de banheiros femininos, a escrita varia do convencional (canetas, lápis, batom, rímel...) ao não convencional (que bem... é melhor não comentar!).  
            Não há um foco de assuntos a serem tratados, alguns vão de simples xingamentos para inimigas a verdadeiras reflexões sobre o cotidiano em forma de versos ou poemas, há ainda aquelas que se revoltam contra o sistema.
            Contudo, não existem somente as escritoras de banheiro, também se inserem nesse contexto as revisoras de banheiro, que podem ser linguistas ou gramaticistas. As críticas também não ficam de fora, sempre de batom a postos sugerindo novas ideias às escritoras.
            Esses escritos, desconhecidos pelos homens, formam uma rede de comunicação atípica, em que mulheres que se mostram socialmente frágeis e inibidas expõem, mesmo que no mundo dos banheiros, quem realmente são. 

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Canção

Criemos uma canção
Que flua sem rima e acordes,
Sem palavras e som,
Que embale os bêbados na calçada,
Que surja como o vento:
Alegrando os moleques e suas pipas.
Que inspire, mesmo sem acordes,
Aqueles que acreditam em um pouco de poesia.

É hoje!

- É hoje! Fiz um pacto comigo mesma!
- Xiiii, já ouvi isso antes... Não vai dizer que você...
- Sim! Dessa vez é sério, nunca estive tão certa em toda a minha vida!
- Ainda lembro... Da última vez o discurso era...
- ...
- Era... Ará! Lembrei! Você tinha jurado pela sua mãe!
- Lembro... Mas você sabe que terminei o namoro com o Beto, que não foi fácil...
- Certamente... Como daquela vez em que você fez uma promessa para o Santo Expedito, aliás, você pagou a promessa?
- Bem... Pretendo pagar tudo de uma vez! Como estava dizendo a coisa é séria! Decidi mudar de vida, ser uma nova mulher, repaginar...
- Você não pagou a promessa?! Não acredito! Pensando bem acredito e faço pouco! Somos amigas há tantos anos, já ouvi isso milhares de vezes! Agora quem não acredita sou eu!
- Quer ver? Posso jurar por você! Pela nossa amizade!
- Não faça isso! Prefiro continuar sendo sua amiga, afinal esse assunto é seu, não está aqui quem falou!
- Nossa! Estou tão desacreditada assim? Você vai ver! Dessa vez é diferente!
- Sim, entendo... Mas é uma pena! Hoje é aniversário da minha mãe e ela te convidou para jantar lá em casa, vai ter macarronada...
- Aquela macarronada?
- Sim...
- Bem... Se é assim tão importante, aniversário da sua mãe...
-...
- Posso começar a dieta amanhã!